domingo, 15 de maio de 2011

Beija-Flor


Beija-flor
que beija a flor
que prova do néctar
amante de uma bela flor

Beija-flor
pássaro lindo
com seu voo cristalino
que paira no ar
e assim só encantar

Beija-flor
que ama a flor
que não importa a cor
somente quer beijá-las flor

Beija-flor
um belo colírio
com seu voo arredio
que nos leva a pensar
como pode um ser tanto amar

Beija-flor
que beija
ama
idolatra
flor
néctar
que amor

Eduardo Ferreira Dias de Souza

sexta-feira, 13 de maio de 2011

PÍLULAS DO GRANDE SERTÃO...


Coração de gente — o escuro, escuros.

Quem ama é sempre muito escravo, mas não obedece nunca de verdade. 

Querer o bem com demais força, de incerto jeito, pode já estar sendo se querendo o mal por principiar.

No sistema de jagunços, amigo era o braço, e o aço! 

Amigo, para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de 
estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou — amigo — é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por quê é que é. 

O amor? Pássaro que põe ovos de ferro. 

Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só a fazer outras maiores perguntas. 

A colheita é comum, mas o capinar é sozinho.

O diabo é às brutas; mas Deus é traiçoeiro! 

O diabo na rua, no meio do redemunho.

O Arrenegado, o Cão, o Cramulhão, o Indivíduo, o Galhardo, o Pé-de-Pato, o Sujo, o Homem, o Tisnado, o Coxo, o Temba, o Azarape, o Coisa-Ruim, o Mafarro, o Pé-Preto, o Canho, o Duba-Dubá, o Rapaz, o Tristonho, o Não-sei-que-diga, O-que-nunca-se-ri, o Sem-Gracejos... Pois, não existe! E se não existe, como é que se pode se contratar pacto com ele?

Quem muito se evita, se convive. 

Julgamento é sempre defeituoso, porque o que a gente julga é o passado. 

O que lembro, tenho. 

Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende. 

Quem mói no asp'ro não fantaseia. 

Quando se curte raiva de alguém, é a mesma coisa que se autorizar que essa própria pessoa passe durante o tempo governando a idéia e o 
sentir da gente. 

Vingar... é lamber, frio, o que outro cozinhou quente demais. 

Quem sabe do orgulho, quem sabe da loucura alheia?

Ser chefe — por fora um pouquinho amargo; mas, por dentro, é risonhas flores.

Um chefe carece de saber é aquilo que ele não pergunta.

Comandar é só assim: ficar quieto e ter mais coragem.

Toda saudade é uma espécie de velhice. 

Riu de me dar nojo. Mas nojo medo é, é não?

Um sentir é do sentente, mas outro é do sentidor. 

Tudo é e não é. 

Mocidade é tarefa para mais tarde se desmentir.

Sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado! 

O sertão é do tamanho do mundo. 

Sertão é dentro da gente. 

O sertão é sem lugar. 

O sertão não tem janelas, nem portas. E a regra é assim: ou o senhor bendito governa o sertão, ou o sertão maldito vos governa. 

O sertão não chama ninguém às claras; mais, porém, se esconde e acena. 

O sertão é uma espera enorme. 

Sertão: quem sabe dele é urubu, gavião, gaivota, esses pássaros: eles estão sempre no alto, apalpando ares com pendurado pé, com o olhar remedindo a alegria e as misérias todas.

A vida é ingrata no macio de si; mas transtraz a esperança mesmo do meio do fel do desespero. 

A vida é muito discordada. Tem partes. Tem artes. Tem as neblinas de Siruiz. Tem as caras todas do Cão e as vertentes do viver. 

Manter firme uma opinião, na vontade do homem, em mundo transviável tão grande, é dificultoso.

Viver — não é? — é muito perigoso. Porque ainda não se sabe. Porque aprender-a-viver é que é o viver mesmo.

Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães...

Feito flecha, feito fogo, feito faca.

Vi: o que guerreia é o bicho, não é o homem.

Até que, um dia, eu estava repousando, no claro estar, em rede de algodão rendada. Alegria me espertou, um pressentimento. Quando eu olhei, vinha vindo uma moça. Otacília. Meu coração rebateu, estava dizendo que o velho era sempre novo. Afirmo ao senhor, minha Otacília ainda se orçava mais linda, me saudou com o salvável carinho, adianto de amor.

João Guimarães Rosa