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sábado, 22 de setembro de 2012

Momento da Poesia...

Consciência Cósmica


Já não é preciso de rir.
Os dedos longos do medo
largaram minha fronte.
E as vagas do sofrimento me arrastaram
para o centro remoinho da grande força,
que agora flui, feroz, dentro e fora de mim...

Já não tenho medo de escalar os cimos
onde o ar limpo e fino pesa para fora,
e nem de deixar escorrer a força dos meus músculos,
e deitar-me na lama, o pensamento opiado...

Deixo que o inevitável dance, ao meu redor,
a dança das espadas de todos os momentos.
E deveria rir, se me restasse o riso,
das tormentas que pouparam as furnas da minha alma,
dos desastres que erraram o alvo de meu corpo...

João Guimarães Rosa

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Frase do Dia...


"Olhar para trás após uma longa caminhada pode fazer perder a noção da distância que percorremos, mas se nos detivermos em nossa imagem, quando a iniciamos e ao término, certamente nos lembraremos o quanto nos custou chegar até o ponto final, e hoje temos a impressão de que tudo começou ontem. Não somos os mesmos, mas sabemos mais uns dos outros. E é por esse motivo que dizer adeus se torna complicado! Digamos então que nada se perderá. Pelo menos dentro da gente..."

João Guimarães Rosa

sexta-feira, 13 de maio de 2011

PÍLULAS DO GRANDE SERTÃO...


Coração de gente — o escuro, escuros.

Quem ama é sempre muito escravo, mas não obedece nunca de verdade. 

Querer o bem com demais força, de incerto jeito, pode já estar sendo se querendo o mal por principiar.

No sistema de jagunços, amigo era o braço, e o aço! 

Amigo, para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de 
estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou — amigo — é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por quê é que é. 

O amor? Pássaro que põe ovos de ferro. 

Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só a fazer outras maiores perguntas. 

A colheita é comum, mas o capinar é sozinho.

O diabo é às brutas; mas Deus é traiçoeiro! 

O diabo na rua, no meio do redemunho.

O Arrenegado, o Cão, o Cramulhão, o Indivíduo, o Galhardo, o Pé-de-Pato, o Sujo, o Homem, o Tisnado, o Coxo, o Temba, o Azarape, o Coisa-Ruim, o Mafarro, o Pé-Preto, o Canho, o Duba-Dubá, o Rapaz, o Tristonho, o Não-sei-que-diga, O-que-nunca-se-ri, o Sem-Gracejos... Pois, não existe! E se não existe, como é que se pode se contratar pacto com ele?

Quem muito se evita, se convive. 

Julgamento é sempre defeituoso, porque o que a gente julga é o passado. 

O que lembro, tenho. 

Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende. 

Quem mói no asp'ro não fantaseia. 

Quando se curte raiva de alguém, é a mesma coisa que se autorizar que essa própria pessoa passe durante o tempo governando a idéia e o 
sentir da gente. 

Vingar... é lamber, frio, o que outro cozinhou quente demais. 

Quem sabe do orgulho, quem sabe da loucura alheia?

Ser chefe — por fora um pouquinho amargo; mas, por dentro, é risonhas flores.

Um chefe carece de saber é aquilo que ele não pergunta.

Comandar é só assim: ficar quieto e ter mais coragem.

Toda saudade é uma espécie de velhice. 

Riu de me dar nojo. Mas nojo medo é, é não?

Um sentir é do sentente, mas outro é do sentidor. 

Tudo é e não é. 

Mocidade é tarefa para mais tarde se desmentir.

Sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado! 

O sertão é do tamanho do mundo. 

Sertão é dentro da gente. 

O sertão é sem lugar. 

O sertão não tem janelas, nem portas. E a regra é assim: ou o senhor bendito governa o sertão, ou o sertão maldito vos governa. 

O sertão não chama ninguém às claras; mais, porém, se esconde e acena. 

O sertão é uma espera enorme. 

Sertão: quem sabe dele é urubu, gavião, gaivota, esses pássaros: eles estão sempre no alto, apalpando ares com pendurado pé, com o olhar remedindo a alegria e as misérias todas.

A vida é ingrata no macio de si; mas transtraz a esperança mesmo do meio do fel do desespero. 

A vida é muito discordada. Tem partes. Tem artes. Tem as neblinas de Siruiz. Tem as caras todas do Cão e as vertentes do viver. 

Manter firme uma opinião, na vontade do homem, em mundo transviável tão grande, é dificultoso.

Viver — não é? — é muito perigoso. Porque ainda não se sabe. Porque aprender-a-viver é que é o viver mesmo.

Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães...

Feito flecha, feito fogo, feito faca.

Vi: o que guerreia é o bicho, não é o homem.

Até que, um dia, eu estava repousando, no claro estar, em rede de algodão rendada. Alegria me espertou, um pressentimento. Quando eu olhei, vinha vindo uma moça. Otacília. Meu coração rebateu, estava dizendo que o velho era sempre novo. Afirmo ao senhor, minha Otacília ainda se orçava mais linda, me saudou com o salvável carinho, adianto de amor.

João Guimarães Rosa

sábado, 30 de outubro de 2010

Frase do Dia...


Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia
João Guimarães Rosa